São muitos os problemas que o transporte público da cidade de São Paulo tem que enfrentar, mas, o que parece mais desafiador para a SPUrbanuss no momento é a dificuldade de atender à legislação sobre emissão de poluentes. A conclusão, no ano passado, da longa licitação que atualizou as concessões para operação do sistema de transporte por ônibus trouxe desafios, não novos, para as 24 empresas concessionárias dos 32 lotes do sistema. Mas, para pelo menos um deles, a solução continua uma incógnita: como atender à Lei 16.802/2018, conhecida como Lei de Mudanças Climáticas.
Segundo Francisco Christovam, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss) as exigências para a redução de emissão de poluentes no transporte público por ônibus são quase impossíveis de serem cumpridas dentro do tempo estabelecido.
De acordo com o presidente da SPUrbanuss, não há disponibilidade de ônibus movidos a energias alternativas à venda, em número suficiente e no prazo definido, para atender às necessidades das empresas que transportam passageiros na cidade e isso inclui ônibus elétricos, a gás – seja o gás natural veicular (GNV) ou o biometano –, HVO (biocombustível obtido a partir de óleos vegetais ou gorduras animais), ou qualquer outra opção de propulsão alternativa conhecida no mercado nacional.
Isto porque as metas de substituição dos quase 14 mil ônibus que circulam em São Paulo (ver tabela) por modelos menos poluentes são anuais e, de maneira gradual, as empresas têm que alcançar 50% de redução de dióxido de carbono (CO2) em dez anos e 100% em 20 anos. Além disso, as operadoras têm que diminuir em 90% a emissão de materiais particulados em dez anos e em 95% em 20 anos. Também as emissões de óxidos de nitrogênio terão que ser minimizadas em 80% em dez anos e em 95% em 20 anos. É, sem dúvida, um desafio e tanto para uma cidade que transporta cerca de 6 milhões de passageiros por dia.
Logo em 2020, e nos próximos anos, já seria necessária a renovação de grande parte da frota atual por veículos 100% elétricos para atingir essas determinações, mas há diversas complicações. A primeira é a necessidade de implantar uma infraestrutura de carga/recarga que representa um investimento significativo nas garagens das empresas e, dependendo da linha, em outros pontos do trajeto. Quem financiará esses custos? Quem assegurará que a eletricidade fornecida foi gerada por fonte limpa sem uso de combustível fóssil?
Outra incerteza é a disponibilidade de um grande número de ônibus elétricos no mercado nacional, em diferentes modelos para atender às necessidades de cada concessionária e dentro um prazo curtíssimo. O sistema estrutural, por exemplo – a operação é dividida em três sistemas: Estrutural, Articulação Regional e Distribuição – utiliza veículos de grande capacidade de passageiros, como os biarticulados, e, nessa categoria, os fabricantes de ônibus ainda não oferecem versões elétricas. Há ainda a questão das condições adversas das vias da cidade. O relato de Christovam é de que um ônibus 100% elétrico testado em São Paulo não teria suportado as condições severas da operação e teria apresentado rachadura no chassi.
Também estão em avaliação alternativas como o gás, seja o GNV ou o biometano, e o HVO, mas, segundo Delfim Ignácio Santos Abreu Filho, assessor técnico para assuntos de tecnologia do SPUrbanuss, ainda não há produção em escala suficiente ou disponibilidade desses insumos para atender à demanda do transporte público de São Paulo. A prometida produção de HVO no Paraguai já estaria, segundo ele, quase totalmente vendida para o mercado norte-americano. O gás também precisaria de investimentos para ser levado até as garagens das empresas.
Christovam conta que o SPUrbanuss tem feito reuniões com os diversos players envolvidos nessa cadeia, mas não tem chegado a uma solução. De acordo com ele, o feedback da própria Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que representa a indústria de chassis para ônibus, é de que será difícil fornecer esses ônibus de propulsão alternativa dentro do prazo definido. Procurada pelo portal FutureTransport, a Anfavea não se manifestou sobre o assunto até o fechamento desta matéria. “Estamos engajados, mas não temos condições de cumprir o prazo estabelecido e, por enquanto, o poder concedente não está disposto a rever esses prazos”, declara o executivo.
Desafios para 2020
Além das dificuldades para cumprir as metas de redução das emissões de poluentes, as operadoras do transporte por ônibus em São Paulo têm uma lista de desafios para 2020. (Ver tabela). Tudo começa por realizar, de forma eficiente, a gestão dos novos contratos de concessão que demoraram tanto para sair do papel. Também será preciso investir em infraestrutura e isso inclui as vias, os pontos de ônibus, os abrigos para passageiros e os terminais. São cerca de 4.500 quilômetros de vias utilizadas, de um total de 17 mil km que compõem o sistema viário da cidade.
A renovação da frota, obrigatoriamente de 10% ao ano, vai representar a aquisição de cerca de 1.300 novos ônibus este ano, preferencialmente já com tecnologias menos poluentes e com mais qualidade para o passageiro. Está também entre as metas das operadoras paulistas para 2020 apoiar uma campanha nacional que será lançada no próximo dia 31, em Brasília, pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) para valorização do transporte público coletivo urbano. A campanha vai se chamar “O Brasil é Coletivo” e tem entre seus pilares valorizar o usuário que passará a ser tratado e chamado de cliente.
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