Se as leis fossem cumpridas e não estivéssemos habituados com as famosas “leis que não pegam”, 2018 seria um marco na história das conquistas ambientais e a cidade de São Paulo poderia ter se tornado um exemplo a ser seguido pelo resto do país e do mundo. Pela Lei de Mudanças Climáticas aprovada em 2009, toda a frota de ônibus a diesel da cidade deveria ter sido gradualmente substituída até chegar neste ano com 100% de veículos movidos a combustíveis renováveis, de origem não-fóssil.
Mas, infelizmente, a lei não foi cumprida e na semana passada o prefeito João Doria sancionou uma nova lei (a Lei 16.802, de 17 de janeiro de 2018, que modifica a Lei 14.933, de 2009), com um novo cronograma a ser cumprido pelos operadores do transporte público de São Paulo para reduzir a emissão de poluentes. A saúde da população vai ter que esperar mais alguns anos.
Pelas novas bases, a emissão de gás carbônico (CO2) de origem fóssil tem que cair 50% em um prazo de dez anos e, gradativamente, chegar a 100% de redução em 20 anos. Também no prazo de dez anos deverá haver uma redução mínima de 90% na emissão de material particulado (MP) e de 80% de Óxidos de Nitrogênio (NOx), em relação à medição total da frota de 2016, até diminuir em 95% a emissão dos dois poluentes em 20 anos. As empresas operadoras do transporte público – e também as de coleta de lixo – terão que apresentar anualmente um relatório de emissões das frotas pelas quais são responsáveis
Esses novos parâmetros deverão ser inseridos no edital de licitação do sistema municipal de transporte de passageiros cuja minuta está em fase de consulta pública até o início de fevereiro.
E a questão ambiental é um dos pontos que precisam ser mais bem esclarecidos na nova licitação, que prevê enxugar o sistema de 1.336 linhas para 1.187 e reduzir os 14.444 ônibus que compõem a atual frota das empresas concessionárias dos subsistemas estrutural e local para 13.603 ônibus.
Para cumprir as metas de mudanças climáticas, será preciso mudar toda a tipologia da frota de ônibus urbanos para um perfil de motorização que não use combustível fóssil. Na visão de
Francisco Christovam, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss), a tendência, neste momento, é o veículo elétrico porque é um dos poucos que não emitem CO2 de origem fóssil.
Porém, a preocupação dos operadores é a incerteza sobre a confiabilidade da tecnologia hoje disponível no país e o custo da infraestrutura necessária para abastecer os veículos. “Embora o veículo elétrico já seja operado lá fora, aqui nós ainda temos um monte de dúvidas. Primeiro, em relação à autonomia, já que nos é exigida uma autonomia de 250 quilômetros e até agora só foram comprovados no mercado nacional 200 quilômetros de autonomia.
Outra questão é o tempo de carga das baterias, de três horas. Geralmente, na operação de uma garagem, a frota começa a ser recolhida por volta da meia noite e se prepara para sair novamente às 4 da manhã. Então, é um período muito curto que o veículo fica na garagem”, pondera Christovam.
Ele questiona que se a carga completa da bateria de um ônibus demora três horas, como carregar a frota toda no período de três a cinco horas? E, fisicamente, como isso seria feito? Imaginando-se todos os veículos parados no mesmo sentido, de ré no muro, atrás de cada veículo seria necessário ter um ponto de abastecimento para poder plugar no banco de baterias. “Será que vai ser possível carregar toda a frota ao mesmo tempo? São experiências que ninguém tem. É preciso lembrar que a menor garagem da cidade opera cerca de 150 ônibus que passariam por essa situação”, ressalva Christovam.
Outra tecnologia alternativa seria utilizar o combustível proveniente do álcool porque ele emite CO2, mas não é de origem fóssil, porém, novamente, “seria necessário mudar os motores dos ônibus, porque esse combustível não pode ser usado no motor diesel.”
“Outra coisa que nos preocupa nessa questão é que pelo novo edital a confiabilidade passará a ter peso extremamente grande porque se não garantirmos a frota e a viagem especificadas no contrato seremos penalizados na equação de remuneração. Se, mesmo colocando toda a frota exigida, o operador não conseguir cumprir as viagens acordadas, ele será penalizado mesmo assim e ainda não sabemos se temos confiabilidade tecnológica do veículo elétrico para evitar que isso aconteça”, declara o executivo.
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