Para garantir que o tema da mobilidade urbana, com indicação de possíveis soluções para melhorar a qualidade do transporte público, seja inserido nos programas dos principais candidatos à Presidência da República, empresários do setor de transporte por ônibus apresentaram ontem (01/08) propostas de melhorias do segmento para representantes dos partidos que lideram as candidaturas na disputa pelo cargo de presidente.
O objetivo é que o assunto seja inserido nas campanhas como proposta de governo. “Desta forma, poderemos cobrar, futuramente, do presidente ou da presidente que venha a ser eleito, o que foi falado aqui”, destacou Otávio Cunha, presidente-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), entidade que representa um setor formado por cerca de 1.800 empresas operadoras de ônibus.
Durante o painel “E Agora, Brasil? Transporte Público”, realizado na 32ª edição do Seminário Nacional NTU 2018, em São Paulo, Cunha apresentou o documento “Construindo Hoje o Novo Amanhã: Contribuições do Transporte Público para a Mobilidade Urbana”, com sugestões que podem ajudar a superar problemas estruturais do transporte público por ônibus no país e impulsionar melhorias. Foram indicados pelos partidos que concorrem à presidência os representantes Jilmar Tatto, ex-secretário de Transportes da cidade de São Paulo, representando o PT; Jurandir Fernandes, ex-secretário estadual de Transportes de São Paulo, pelo PSDB; Wagner Farjardo, coordenador geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, pelo PCdoB; e Tarcísio Gomes de Freitas, secretário de coordenação de projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Governo Federal, como representante do PMDB.
O cenário mostra que o número de passageiros do transporte público por ônibus caiu 50,3% nos últimos 24 anos. No ano passado, a demanda caiu 9,5% em relação a 2016 (a terceira maior desde o início da série histórica), equivalente à perda diária de 3,6 milhões de passageiros em todo país. Esses usuários migraram para outros meios, como o automóvel particular, motos ou até mesmo para deslocamentos a pé. “A produtividade do setor caiu 38,9% e continua a tendência de queda. Seja pela baixa qualidade do serviço ou pelo alto custo das tarifas, o serviço de ônibus deixou de ser atrativo às pessoas, ele não consegue ser competitivo”, constatou Cunha. Cerca de 50 milhões de cidadãos usam o transporte público para se locomover e 86% deste total utilizam os ônibus urbanos em seus deslocamentos diários.
Os ônibus perderam 35,6% dos passageiros pagantes em pouco mais de 20 anos e a redução da demanda foi agravada nos últimos cinco anos (a partir de 2014), culminando com uma perda média acumulada de 25,9% dos usuários pagantes. Isso de certa forma ajudaria a explicar a necessidade de aumento das tarifas, já que sobraram menos usuários rateando os custos da operação, considerando-se que a oferta do serviço não é reduzida na mesma proporção da queda do número de usuários.
“Nós, operadores, temos feito uma reflexão da origem do problema, aprofundamos esta análise intensamente, com técnicos e profissionais das empresas, para levantar todas as mazelas do transporte público urbano do país, levando em conta os próprios erros e acertos do próprio setor. Fizemos pesquisas junto às empresas e junto à população e deste processo nasceram propostas, que precisam ser divulgadas precisam ser discutidas com outros setores ligados diretamente ao transporte público. O transporte público pode ser de boa qualidade, mas custa caro”, declarou o executivo.
Para alcançar um serviço de qualidade ele defendeu ser necessária boa gestão pública – no planejamento das redes multimodais, integradas física e tarifariamente, no gerenciamento e na fiscalização – e privada – na boa prestação do serviço com qualidade, eficiência e regularidade. Ele lançou um conjunto de seis programas de ação para melhorar o sistema. O primeiro é a prioridade à infraestrutura e à operação, com implantação de novos corredores e faixas seletivas, pontos de parada com abrigo para os passageiros, melhor sistema de informações ao usuários, ônibus mais limpos e seguros, regularidade e eficiência nas viagens.
Em seguida aparece a transparência de informações à sociedade, com uso de tecnologias de bilhetagem e GPS para confirmar dados de demanda e auditagem da gestão. A questão de preços acessíveis envolveria um modelo de fontes extra tarifárias para garantir um serviço de melhor qualidade, mas envolveria recursos orçamentários dos três níveis de governo, além de desoneração tributária e criação de um fundo específico para custear o transporte público. As ações envolvem ainda questões como a segurança jurídica dos contratos, com “processos de concessão com editais e contratos claros e bem detalhados, debatidos em instâncias que assegurem participação social e a adoção de procedimentos de revisão e ajuste contínuo dos contratos às mudanças ocorridas ao longo do período do contrato, para garantir o equilíbrio econômico financeiro da rede de transporte e boa prestação do serviço”.
Os representantes dos partidos mostraram posições convergentes quanto à necessidade de priorizar o transporte coletivo em detrimento do automóvel particular. Tarcísio Gomes de Freitas assinalou que a mobilidade deve ser compreendida de forma integradora e o Ministério das Cidades tem que ter papel fundamental nessa integração. Ele destacou a necessidade de delimitação de faixas exclusivas e a adoção de medidas que desmotivem o uso do carro.
Para Jurandir Fernandes, é preciso haver investimentos públicos no setor que garantam a infraestrutura necessária para que as empresas possam operar o sistema com qualidade. Uma das prioridades do novo governo seria levantar a importância das cerca de 7 mil obras que estão paralisadas, ou que nem sequer saíram do papel, e começar a executar as que já têm projeto pronto, com licenças ambientais aprovadas e que podem dar retorno mais rápido na prática. “O dinheiro é curto e temos que usar racionalmente, então eu começaria pelas obras paralisadas”, disse Fernandes.
Na opinião de Jilmar Tatto, a prioridade seria tirar carros das ruas para liberar mais espaços para os ônibus, aumentando a velocidade média dos coletivos com o uso de mais faixas exclusivas. “Com isso, iríamos queimar menos combustível, teríamos menos poluição, haveria menos espera nos pontos de ônibus e todos poderiam chegar mais cedo em casa. Em São Paulo, fizemos 400 km de faixas exclusivas, saindo de uma velocidade média de 12 para 22 km/h, eu faria isso no Brasil inteiro”, declarou.
Já Wagner Farjardo abordou a necessidade de modernizar a frota de ônibus, o que poderia ser exigido já nas licitações a serem feitas. Segundo dados da NTU, a idade média da frota nas capitais é de cinco anos e quatro meses, mas muitas cidades têm frotas envelhecidas, com idade superior a dez anos. Ele ressaltou também a importância de implantar novos corredores e faixas seletivas para favorecer a circulação dos ônibus. Cálculos do setor mostram que os automóveis, que movimentam apenas 20% das pessoas, ocupam 75% das ruas, enquanto os ônibus, que transportam 70% das pessoas, ocupam apenas 20% das vias.
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