A primeira vista parecem com os sofisticados teleféricos para turistas dos Alpes, mas fazem parte do sistema de transporte coletivo de Medellin, na Colômbia, que transporta dezenas de milhares de pessoas por dia, ligando alguns dos bairros mais pobres da cidade.
A cidade mais perigosa do mundo na década de 1990 foi substituída pela “cidade mais inovadora” do mundo em 2013, de acordo com Jorge Pérez-Jaramillo, urbanista, autor, e um planejador da cidade entre 2012 e 2015.
Não intrusivos, os teleféricos foram uma resposta lógica para terrenos íngremes e montanhosos em uma região tão densamente povoada como Medellín onde a implantação dos transporte públicos convencionais, como ônibus ou trens não são viáveis e, como bônus, a região ganhou uma solução de transporte de baixíssima emissão.
Medellín foi a primeira cidade a construir teleféricos para atender às comunidades mais pobres, em vez dos ricos ou turistas. Os teleféricos se conectam à rede de trens da cidade (o metrô foi inaugurado em 1995), bondes, ônibus e bicicletas públicas gratuitas.
O plano de mobilidade da cidade, segundo Carlos Moreno, professor da Universidade Panthéon-Sorbonne, em Paris e criador do conceito da “cidade de 15 minutos”, foi projetado em parte para ajudar a quebrar as barreiras entre bairros ricos e pobres extraordinariamente segregados.
Nos anos 90, habitações improvisadas e informais se expandiram constantemente pelas encostas íngremes, em meio a um dos maiores movimentos mundiais de pessoas deslocadas internamente – resultado da agitação da violenta era de Pablo Escobar.
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O sistema de teleféricos, batizado de MetroCable, foi inaugurado em 2004 e reduziu para apenas 30 minutos uma viagem de duas horas, muitas vezes fisicamente cansativa, entre os bairros montanhosos e o centro de Medellín. Os benefícios econômicos ficaram óbvios.
Pérez-Jaramillo diz que um jovem lhe disse recentemente que “a razão pela qual posso ir para a universidade é porque temos teleféricos”. Sem eles, ele não conseguiria arcar com o tempo e o custo de chegar lá todas as semanas. Uma mulher que vende empanadas perto do estádio de futebol de Medellín disse a ele que agora pode transportar o triplo do produto para seu estande.
O impacto do MetroCable
Medellín foi um experimento natural que acadêmicos, urbanistas e economistas correram para estudar. A pesquisa mostrou que as taxas de homicídio e violência percebida diminuíram em toda a cidade, mas caíram mais significativamente nos bairros com MetroCables.
No geral, a expectativa de vida, os níveis de educação e o acesso a alimentos melhoraram, principalmente para as comunidades mais pobres. As taxas de pobreza caíram de 37% da população da cidade em 2002 para 14% em 2018, observaram outros pesquisadores.
O impacto direto na acessibilidade e no tempo de deslocamento contribuíram para uma maior inclusão social, onde as populações mais carentes enxergaram opções fora das gangues e do crime, que ofereciam as oportunidades mais visíveis em uma comunidade outrora isolada.
Para esse fim, as linhas de trânsito foram acompanhadas por novas instalações educacionais e amplos espaços culturais públicos, como parques de bibliotecas próximos.
Foi uma escolha consciente investir em estratégias de inclusão social, em vez de aplicar esses fundos na construção de moradias ou policiamento pesado, diz Soledad Garcia-Ferrari, professora de estudos urbanos da Universidade de Edimburgo que pesquisou a cidade de Medellín.
Especialistas atribuíram o progresso de Medellín, entre outras coisas, aos movimentos iniciais dos líderes da cidade para trazer as comunidades afetadas pelas decisões para o processo de planejamento.
Um projeto comunitário, por exemplo, no qual os moradores simplesmente pediam uma nova trilha para caminhada e ciclismo, foi co-projetado por eles e pelos planejadores da cidade. Agora, ela conecta bairros anteriormente desconectados ao longo da montanha, escrevem os autores do relatório. “Foi mais do que simbólico”, comentam. O projeto incluiu a estabilização das encostas íngremes das montanhas para evitar deslizamentos de terra e dezenas de hectares de áreas cultiváveis para alimentos, tanto para a comunidade, quanto para venda nos mercados.
No geral, “as ferramentas de planejamento participativo foram tão importantes quanto as próprias ferramentas de infraestrutura que foram usadas”, diz Garcia-Ferrari.
Essa é a maior lição para outras cidades que desejam duplicar o sucesso do trânsito de Medellín, incluindo La Paz, na Bolívia, e Caracas, na Venezuela.
Já por aqui, os teleféricos do Rio de Janeiro, inaugurados em 2011, tiveram vida curta e, sem adesão da população, fechou em 2016.